18.1.06

Resposta aos contraditórios do IPPAR e da Metro do Porto

Resposta aos contraditórios do IPPAR e da Metro do Porto
[resposta às excepções de natureza processual ]

«Exmo Senhor Juiz de Direito do tribunal Administrativo e Fiscal do Porto

Processo n.º 2481/05.7BEPRT
Processo cautelar

Os requerentes nos autos, notificados das oposições apresentadas pelos requeridos, vêm pronunciar-se sobre as excepções dilatórias aí suscitadas, do modo que segue:

I -Quanto à providência de suspensão de eficácia do Despacho do presidente do IPPAR
1. Ficaram os réus a saber, em função do conteúdo das oposições apresentadas, que as obras autorizadas pelo despacho suspendendo terão já sido concluídas.


2. No âmbito de um processo a que, desde o início, faltou transparência (há duas semanas atrás a Metro do Porto, SA recusou aos aqui requerentes o acesso à documentação correspondente), marcado por autorizações parcelares para diferentes fases da execução do plano de intervenção no conjunto da Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados e Praça General Humberto Delgado, e em que as obras, por duas vezes, começaram antes de haverem sido emitidas as necessárias autorizações do IPPAR, não é fácil, para um observador externo, saber quando, exactamente, termina uma coisa e começa a outra.

3. Embora, no momento da apresentação do requerimento inicial, os requerentes estivessem persuadidos, em face do que era possível observar no terreno e do que se podia ler nos documentos acessíveis, que as obras da primeira fase ainda não tinham terminado, não lhes custa nada admitir que, afinal, fosse outra a realidade.

4. Os requerentes admitem, portanto, que as obras da primeira fase de execução do plano de intervenção no conjunto da Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados e Praça General Humberto Delgado tenham terminado.

5. Donde, os requerentes deixaram de ter interesse processual na suspensão da eficácia do despacho do presidente do IPPAR de 06 de Junho de 2005.

6. Pelo que, quanto ao pedido dessa providência cautelar, e só quanto a ele, nada há obstar à absolvição da instância daquela entidade pública.

7. Isto posto, perde qualquer utilidade a discussão da questão da alegada caducidade do direito de os requerentes pedirem tal providência.

8. Embora, para "defesa da honra", se deva dizer que não têm qualquer cabimento as alegações dos requeridos, uma vez que os requerentes, como resulta dos documentos juntos aos autos, apenas em 30 de Agosto tiveram conhecimento do conteúdo do despacho do presidente do IPPAR.

9. Pelo que, mesmo que o prazo disponível para instaurar o processo cautelar fosse de apenas 3 meses (e não é, visto que se trata de providência requerida ao abrigo do art. 120.º/1-a) do CPTA, que implica, por necessidade, uma apreciação liminar da legalidade do acto, sobretudo quando se lhe imputa exclusivamente vícios geradores de nulidade), situando-se o seu termo inicial em 16 de Setembro (art. 58.º/3 do CPTA e 144.º/4 do CPC), apenas se esgotaria em 16 de Dezembro de 2005.

10. Sendo, aliás, chocante que o IPPAR defenda, na sua oposição, que o prazo para a acção de impugnação deveria começar a correr antes mesmo de existir o acto impugnado, só porque, ilegalmente, as obras de execução já haviam começado previamente.

II -Quanto ao pedido de intimação do IPPAR para se abster de autorizar as obras da segunda fase de execução do plano de intervenção da Metro do Porto, SA

11. Sabendo da iminência da instauração do presente processo cautelar, o presidente do IPPAR, através de Despacho emitido no domingo de 11 de Dezembro de 2005 (reconheça-se a diligência e o desvelo de quem trabalha ao domingo), autorizou a realização das obras da segunda fase de execução do plano de intervenção da Metro do Porto, SA.


12. Desse Despacho, notificado à Metro do Porto, SA por ofício de 13 de Dezembro, tiveram os requerentes conhecimento apenas no momento em que foram notificados das oposições dos requeridos _ tratando-se, portanto, de um facto superveniente ao momento de entrada do requerimento inicial na secretaria do tribunal (12 de Dezembro).

13. O referido Despacho tem um significado confessório e uma consequência processual.

14. Um significado confessório porque, em rigor, ao autorizar os trabalhos da segunda fase da execução do plano de intervenção no conjunto da Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados e Praça General Humberto Delgado, os requeridos reconhecem não só que a autorização de 06 de Junho apenas à primeira fase dizia respeito, mas também, e sobretudo, que a Metro do Porto, SA, com a conivência do IPPAR, entre meados de Novembro e 13 de Dezembro, violou impunemente a lei, fazendo obras a descoberto da necessária autorização _ ou seja, os requeridos reconhecem o que, a tal propósito, é alegado no requerimento inicial deste procedimento cautelar.

15. A consequência processual é óbvia: tendo o IPPAR autorizado a realização das obras da segunda fase do plano de intervenção da Metro do Porto, SA, o pedido da providência de intimação para a correspondente abstenção deixou de ter, supervenientemente, qualquer utilidade.

16. Quanto a este pedido cautelar, admite-se, naturalmente, sem qualquer rebuço, a inevitabilidade de extinção parcial da instância.

17. Boa parte do conflito entre as partes (melhor dizendo, entre os requeridos e os bens de fruição colectiva defendidos pelos requerentes), transferir-se-á para o processo cautelar endereçado ao decretamento da suspensão da eficácia do Despacho do presidente do IPPAR de 11 de Dezembro, cujo requerimento inicial, no momento presente, já deu entrada na secretaria deste tribunal.


III -Quanto à providência de intimação para a Metro do Porto, SA cessar as obras que vem realizando

18. Quanto ao pedido de intimação para a cessação das obras em curso, a Metro do Porto, SA alega, desde logo, que, por extemporaneidade, teria caducado o direito de acção dos requerentes.
19. No entendimento daquela requerida, ter-se-ia esgotado o prazo de 3 meses previsto no art. 58.º do CPTA, referente à acção especial de impugnação de actos administrativos.

20. Ora se, em tese, poderia admitir-se semelhante raciocínio quanto à providência de suspensão de eficácia, já o mesmo se revela completamente descabido a respeito da providência de que ora se trata.

21. Efectivamente, a providência de intimação para a cessação das obras, como se esclarece no artigo 8 do requerimento inicial, constitui preliminar da acção principal em que se pedirá a condenação do IPPAR, do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAOT) e do Município do Porto a, no exercício das competências de fiscalização e regulação que a lei lhes atribui, emitirem decisões que obriguem a Metro do Porto SA a cessar as obras ilegais que vem realizando e a repor a situação preexistente.

22. Trata-se, portanto, de uma acção administrativa especial destinada à condenação na prática de um acto devido (arts. 66.º e ss. do CPTA).

23. Como decerto é do conhecimento da Metro do Porto, SA (haja honestidade argumentativa!), os prazos para a propositura deste tipo de acção especial acham-se previstos no art. 69.º do CPTA, e não no art. 58.º.

24. Ora, tratando-se, no caso em apreço, de uma situação em que as entidades a demandar na acção principal, não obstante as instâncias dos requerentes, continuam inertes e silentes (não deferindo, nem indeferindo), o direito de acção apenas caduca decorrido que seja 1 ano após o termo do prazo legal para a prática do acto devido.

25. Sabendo-se que, no caso dos autos, a actuação ilegal da Metro do Porto, SA se iniciou em Maio de 2005, é patente, mesmo que o prazo de 1 ano se iniciasse nesse mês, que jamais se pode dizer ter caducado o direito de agir.

26. Além da excepção de caducidade do direito de agir _ que já vimos ser completamente infundada _, alega também a Metro do Porto, SA que os requerentes não teriam indicado, no requerimento inicial, a acção principal de que dependeria a providência cautelar de intimação para a cessação das obras, em pretensa violação do disposto no art. 114.º/3-e) do CPTA.

27. A este respeito, a Metro do Porto, SA ensarilha-se em equívocos de vária ordem. Desmontemo-los:
28. Em primeiro lugar, deve sublinhar-se que não há qualquer violação do art. 114.º/3-e) do CPTA, uma vez que os requerentes, no já citado 8 do requerimento inicial, identificam com clareza o processo principal a que, subsequentemente, será apenso o presente processo cautelar.
29. O problema daquela requerida, aliás, é outro (embora por ela própria incorrectamente equacionada): a Metro do Porto, SA crê que o pedido cautelar que contra ela é dirigido tem de ser dependência de uma acção principal também contra ela proposta; e como uma acção contra um particular (no caso uma sociedade anónima) não pode ser instaurada ao abrigo da legitimidade popular, por força do disposto no art. 37.º/3 do CPTA, faltaria aos requerentes legitimidade para demandarem a concessionária de metro do Porto

30. Entendamo-nos: é verdade que o disposto no art.º 37.º/3 do CPTA não admite uma acção popular proposta por particulares contra outros particulares. Ninguém minimamente sabedor porá isso em causa.

31. É, de resto, por isso mesmo, que os requerentes não instaurarão contra a Metro do Porto, SA qualquer acção principal _ a qual, pois, deliberadamente, se omitiu no artigo 8 do requerimento inicial.

32. O que é, porém, absolutamente despropositado é pensar-se, ou pretender-se, que uma providência cautelar de abstenção de um comportamento por parte de um particular só pode ser dependência de uma acção principal contra ele próprio instaurada.

33. No direito processual administrativo português, já há muito é possível, no âmbito da providência de intimação para um comportamento que estava prevista no art. 86.º da LEPTA, que os particulares solicitem a abstenção de uma conduta de outro particular como meio acessório de uma acção principal proposta contra a entidade pública inerte no exercício das suas competências.

34. Mais: no âmbito do art.86.º da LEPTA, era mesmo forçoso, e inevitável, que a acção principal fosse proposta contra o órgão administrativo competente.

35. O art.112.º/2-f) do CPTA, que sucede àquele preceito da LEPTA, continua a permitir, evidentemente, providências de intimação contra particulares como dependência e acessório de acções principais promovidas contra entidades públicas _ é, de resto, essa a situação normal .

36. O art. 37.º/3 do CPTA (referente à acção administrativa comum, e não à especial), não pondo em causa o acquis proveniente da intimação para um comportamento do art.86.º da LEPTA (sobretudo se se pensar que o CPTA está impregnado e é dominado pelo princípio pro actione), acrescenta-lhe, no domínio do chamado contencioso de particulares, um plus inovador: permite que um particular possa demandar em via principal um outro particular.

37. Donde, em face do direito em vigor, o contencioso administrativo de particulares compreende duas modalidades: providência de intimação requerida por um particular contra outro particular como acessório de uma acção administrativa especial proposta contra uma entidade pública, ao abrigo do art. 112.º/2-c) do CPTA; acção administrativa comum instaurada por um particular contra outro particular, com base no art. 37.º/3 do CPTA.

38. No caso em apreço, a providência cautelar cujo decretamento é pedido pelos requerentes insere-se na primeira daquelas modalidades: é, portanto, inteiramente admissível, sem ter que constituir apenso de qualquer acção principal a instaurar contra a Metro do Porto, SA.

Em suma, considerando os conhecimentos e os factos supervenientes à instauração do processo cautelar (bem reveladores, aliás, do comportamento lastimável das requeridas), entendem os requerentes que:

a) deve o IPPAR ser absolvido da instância quanto à providência de suspensão de eficácia do Despacho de 06 de Junho de 2005, uma vez que, por já estar a sua execução consumada, deixou de haver interesse processual;
b) deve julgar-se extinta a instância quanto ao pedido de intimação do IPPAR para se abster de autorizar as obras da segunda fase de execução do plano de intervenção da Metro do Porto, SA, dado que aquela entidade já emitiu tal autorização, através do Despacho, da autoria do seu presidente, datado de 11 de Dezembro;
c) deve a instância continuar normalmente a sua tramitação relativamente ao pedido de intimação da Metro do Porto, SA para cessar as obras de demolição que vem realizando no conjunto da Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados e Praça General Humberto Delgado.

A Sociedade de Advogados»

17.1.06

Os Aliados e a Justiça

  • 12 Maio 2006- Nos jornais -Obras nos Aliados em tribunal- no JN
  • 11 Maio 2006- Acção Administrativa Especial -«Deu entrada no Tribunal Administrativo do Porto -tal como foi anunciado na nota à imprensa do mês de Fevereiro divulgada pelas associações Campo Aberto, APRIL, GAIA após se ter sabido que a pretensão de suspender as obras não tinha sido atendida-uma Acção Administrativa Especial (Versão em pdf aqui
  • 23 Fev 2006- Nos jornais - «Mudança nos Aliados não é irreversível no Jornal de Noticias: Tribunal Administrativo recusa providência cautelar argumentando que seria possível repor o original por Carla Sofia Luz.»
  • 23 Fev 2006- Nota à imprensa - «Obras na Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade»
  • 23 Fev 2006- Nos Jornais- «Tribunal indefere providência cautelar para travar obras na Avenida dos Aliados- Nuno Corvacho -No Público; Obras nos Aliados acabam em Maio -no Jornal de Noticias ; Providência cautelar dos Aliados “improcedente” - N' O Primeiro de Janeiro; Obras nos Aliados são legais- no Jornal de Noticias ; Metro do Porto: obras nos Aliados são legais - no PortugalDiário; Queixa contra as obras nos Aliados - no Jornal de Noticias.»
  • 25 Jan 2006-A avenida que não cabe em si -«Apesar de a Câmara Municipal do Porto (CMP) não ser alvo da acção cautelar por nós interposta a 12 de Dezembro, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, seguindo a sugestão da Metro do Porto, decidiu dar-lhe oportunidade de também apresentar o seu contraditório, o que ela fez a 17 de Janeiro (texto integral aqui em formato pdf)....»
  • 17 Jan 2006- Os Aliados e a Justiça: novos documentos- «1) Como já antes referimos, as associações cívicas APRIL, Campo Aberto e GAIA entregaram em 6 de Janeiro, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, uma nova acção cautelar pedindo a suspensão de eficácia do parecer do IPPAR que ...»
  • 5 Jan 2006- Contraditório da Metro do Porto -«Disponibilizamos neste endereço um ficheiro pdf com o contraditório da Metro à nossa acção cautelar, entregue em tribunal na semana passada e chegado às nossas mãos na terça-feira, 3 de Janeiro. Não vamos fazer um comentário exaustivo a ...»
  • 7 Jan 2006- Nos Jornais-"Nova acção para travar as obras nos Aliados" -«No Jornal de Notícias por Carla Sofia Luz Associações reclamam a suspensão de eficácia do aval do IPPAR No processo, lembram que destruir património em classificação é "crime" (...)»
  • 3 Jan 2006- O IPPAR e os Aliados: documentos & comentários - «Conforme já foi aqui referido, e também noticiado no JN, a acção cautelar contra a Metro do Porto e o IPPAR apresentada no Tribunal Administrativo do Porto em 12 de Dezembro registou na semana passada uma importante evolução: pela resposta do IPPAR ao tribunal ficou-se a saber da nova (quase repentina) autorização emitida por esse organismo para as obras nos Aliados. (...)»
  • 1 Jan 2006- Nos Jornais- Metro iniciou obra sem aval - «No Jornal de Notícias por Carla Sofia Luz -"(...) É a segunda vez que não é cumprida esta formalidade, imprescindível de acordo com a legislação nacional. As máquinas começaram a esventrar a áreas centrais dos Aliados na última semana de Novembro e só a 13 de Dezembro é que o IPPAR concedeu a autorização" (...).»
  • 30 Dez 2005- IPPAR trabalha ao domingo - «O IPPAR, um dos alvos da acção cautelar que deu entrada no dia 12 de Dezembro no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, apresentou ao mesmo tribunal o seu contraditório na passada quarta-feira, 28 de Dezembro. Temos já cópia desse documento e, logo que possível, ele será aqui transcrito e comentado. (...)»
  • 26 Dez 2005- Nos Jornais -"Polémica não trava as obras" «... Associações cívicas apresentaram uma providência cautelar reclamando a interrupção dos trabalhos. ...»
  • 24 Dez 2005-Nos Jornais- "Metro do Porto prossegue obras de requalificação nos ... Os trabalhos da Metro do Porto na Avenida dos Aliados prosseguiam ontem sem aparentes constrangimentos, apesar da providência cautelar apresentada por um grupo de associações cívicas no sentido da suspensão das obras. ...»
  • 24 Dez 2005- Nos Jornais- "Metro do Porto prossegue obras de requalificação nos ... -«No Público - por Nuno Corvacho: «Providência cautelar interposta por associações não faz suspender trabalhos. Metro recusou pedido de consulta do processo, feito pelos ambientalistas da Campo Aberto, e defende legalidade da obra ...»
  • 23 Dez 2005- Notícias - «Metro do Porto: ambientalistas em tribunal para parar obras-in Portugal Diário; (...) Aliados com providências cautelares»- no Primeiro de Janeiro; No Público: por Nuno Corvacho «Associações cívicas exigem à Metro do Porto que suspenda obras nos Aliados- Alegadas "violações à lei" na base da providência cautelar. Metro do Porto já foi citada para efeitos de contestação »
  • 22 Dez 2005- Nos Jornais- "Futuro da obra nos Aliados está nas mãos do tribunal" -«Hoje no JN - "Polémica: Providência cautelar para suspender a empreitada actualmente em curso enviada para o Tribunal Administrativo e Fiscal- Apontadas várias ilegalidades à Metro e ao IPPAR - Obras na Avenida dos Aliados avançam" ...»
  • 20 Dez 2005- Providências cautelares contra Metro do Porto SA e IPPAR -«Texto da petição apresentada no Tribunal Administrativo (Texto do requerimento inicial do processo cautelar preliminar à acção popular a instaurar contra o IPPAR, o MAOT e o Município do Porto)»
  • 20 Dez 2005- CAMPO ABERTO - comunicado à imprensa -«Acção judicial pela salvaguarda da Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade -CAMPO ABERTO - comunicado à imprensa - 20/XII/2005 Obras devem ser paradas de imediato No âmbito de uma acção popular a instaurar contra o IPPAR, o Ministério ... »
  • 15 Dez 2005- PARTICIPAÇÃO NA ACÇÃO JUDICIAL PELA SALVAGUARDA DA AVENIDA DOS ... «Deu entrada na segunda-feira, 12 de Dezembro, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, uma acção popular, animada pelas associações APRIL, Campo Aberto e GAIA, contra a Metro do Porto eo IPPAR, com vista a suster, enquanto é tempo ...»
  • 10 Dez 2005- Do parecer do IPPAR e da sua ilegalidade- opinião jurídica - «[transcrito do Texto da petição apresentada no Tribunal Administrativo (requerimento inicial do processo cautelar preliminar à acção popular a instaurar contra o IPPAR, o MAOT e o Município do Porto) ]»
  • 10 Dez 2005-Nos Jornais- "Futuro da obra nos Aliados está nas mãos do tribunal" -«Hoje no JN - "Polémica: Providência cautelar para suspender a empreitada actualmente em curso enviada para o Tribunal Administrativo e Fiscal- Apontadas várias ilegalidades à Metro e ao IPPAR - Obras na Avenida dos Aliados avançam, mas tribunal pode decretar a sua paralisação Por Hugo Silva(...)»
  • 10 Dez 2005-Providências cautelares contra o IPPAR e a METRO enviadas para o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.
  • 1 Dez 2005- Dos Jornais -"Providência cautelar pode parar as obras nos Aliados" - «Hoje no Jornal de Notícias- por Carla Sofia Luz: As máquinas iniciaram, há uma semana, a retirada da calçada portuguesa e a destruição dos canteiros na placa central da Avenida dos Aliados, no Porto. Mas os trabalhos poderão parar. As associações cívicas Campo Aberto , GAIA, e APRIL, estão decididas a travar a obra e vão interpor, nos próximos dias, duas acções contra o Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) e a Empresa Metro, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto....»

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1.1.06

Opinião # 24 -"O absurdo, mais uma vez!"

A.C.E.R.-ASSOCIAÇÃO CULTURAL E DE ESTUDOS REGIONAIS
(Enviado por ofício à C. M. do Porto em 16.03.2005;
aos Grupos dos Partidos na A.M em 11.06.2005;
à Delegação da Unesco em 14.06.2005 )

O absurdo, mais uma vez!
I - Em 1914 foi lançada por Elísio de Melo a proposta de construção da Avenida dos Aliados aprovada pela Câmara em 1915, sendo contratados os serviços do urbanista Barry Parker para a desenvolver.
Nas "Memórias" (Arquivo Histórico Municipal do Porto) redigidas por este engenheiro inglês, aquando das reuniões com a edilidade, pode ler-se "Longas superfícies de ruas ou de estradas somente dão uma sensação de monotonia, de fadiga, de vácuo. O planeador de hoje já não projecta ruas intermináveis em comprimento. O seu desígnio é criar quadros pitorescos em cada ponto, quadros de agradável dimensões e agradáveis proporções entre os comprimentos, larguras e alturas".
Acrescentava ainda:
"Senti que era meu dever melhorar e não destruir a boa forma e as proporções das vossas praças da Liberdade e da Trindade, aumentando mesmo, em cada uma delas a impressão de encerramento e protecção a que os planeadores de cidades dão tanta importância, quando tratando de praças como estas. Mas o que mais fará despertar a ideia de largura, de amplidão, de comprimento e de dignidade da Avenida é o ela ser parcialmente limitada por linhas convergentes em vez de o ser por linhas exclusivamente paralelas".
O edifício da Câmara
"deverá ser de frente dupla dando de um lado para a nova Praça e do outro para a Praça da Trindade. Fica dominando todo o plano".
Pretendia ‘melhorar em vez de amesquinhar a Praça da Liberdade; a Praça da Trindade não parecerá confinar desairosamente com as edificações do lado sul da praça da Liberdade ou com a Igreja da Trindade.
Resultava daí que a praça da Liberdade assumia, no projecto Barry Parker, um papel destacado: "continuará a ser o vosso principal centro de tráfico, pois que o trânsito pela nova Avenida não será muito grande".

O projecto Siza Vieira/Souto Moura altera o desenho da praça da Liberdade, pois:
-propõe a modificação da actual placa central que, de ovalizada, passa a longitudinal e alinhada com as placas da Av. dos Aliados.
-aumenta a largura dos passeios do lado poente e nascente anexando-os aos da Av. dos Aliados e que ficam plantados de árvores;
-substitui o actual piso, em pequenas pedras de basalto e calcário formando desenhos em alguns sítios, por cubos de granito escuro (segundo parece vindas da China!), que irão cobrir passeios, faixas de rodagem e o núcleo central da praça;
Como consequência, a Praça da Liberdade deixará de ser um espaço perfeitamente individualizado, para passar a ser um mero prolongamento da Avenida dos Aliados.

Aquilo que Barry Parker queria manter (‘a boa forma e as proporções’, a ‘impressão de encerramento’) e de evitar ( ‘as longas superfícies de ruas,’ 'as linhas exclusivamente paralelas’) fica gravemente comprometido com o projecto Siza Vieira/Souto Moura.
Por outro lado, não se justifica o estreitamento da Praça da Liberdade por passeios mais largos e filas de árvores pois não ocorreram modificações nos prédios adjacentes. Eles continuam com a mesma implantação e merecem, pela sua qualidade arquitectónica, continuar a serem apreciados havendo espaço livre em frente às suas frontarias e não serem, ainda que parcialmente, ocultadas por copas de árvores.

Ao apreciar-se a antevisão do projecto existente no átrio da Câmara fica-se perplexo e aturdido com semelhante ‘requalificação’. O impacto da mancha negra fazendo desaparecer os espaços ajardinados e canteiros provoca mesmo angústia. Numa cidade, onde são escassos os espaços verdes como se compreende a impermeabilização de toda a Avenida dos Aliados? Que ‘arquitectura paisagista’ é esta que nos é proposta pelo dream-team ?

Com a intervenção Siza Vieira/Souto Moura, o actual Presidente da Cãmara pretende ‘marcar seguramente a história da cidade’ (in jornal ‘Público’ de 15 de Março 2005).
Em nosso entender, o projecto dos dois arquitectos tenderá a provocar:
- uma desqualificação da praça da Liberdade tornando-a um residual da Av. dos Aliados não respeitando a sacralidade do sítio onde em 7 de Maio de 1829 foram supliciados liberais e em 1891 foi proclamada, pela primeira vez, a República.
-uma ‘requalificação’ para o conjunto Praça+Avenida que, segundo a Arq. Teresa Andresen (in Público’ de 22 Março 2005)"
opta pela neutralização da cor. Que não atende ao carácter neoclássico /beauxartiano/eclético dos edifícios circundantes, assim como do espaço avenida e do espaço praça que ali coabitam construídos ao longo do tempo e nunca de uma vez só".

Numa cidade onde a ‘Porto 2001’ deixou um ‘legado’ de espaços ‘clonados’ (Cordoaria, entre outros), o projecto Siza Vieira/Souto Moura alinha com a estratégia de descaracterização que está a tornar o Porto irreconhecível.

II
A poucos dias da inauguração da estátua de D. Pedro IV comentava-se no "Commercio do Porto" de 13 de Outubro de 1866: "É fora de dúvidas que uma das excellentes qualidades d'esta obra monumental está na boa harmonia das proporções da sua altura relativamente ao espaço da praça; o monumento não podia ser maior nem menor do que realmente está, e n'isto mostrou o snr. Calmels os seus grandes conhecimentos como estatuário".

Durante quase 140 anos não houve intenção por parte das várias edilidades de a inverter ou deslocar o que significa concordância com a posição escolhida. Como se compreende então ser necessário inverter a posição da estátua voltando-a para a Câmara Municipal? Numa altura, de contenção da Despesa Pública como justificar este esbanjamento em semelhante intervenção?
O arq. Siza Vieira, aquando da sessão de apresentação do seu projecto na reunião do executivo camarário em 10 de Outubro de 2000, argumentava que ‘hoje a centralidade da escultura perdeu o sentido. A estátua não está no centro de nada’. Queria-se referir às consequências da demolição do antigo edifício da Câmara Municipal que se situava no extremo norte da Praça da Liberdade. Pretendia com o seu projecto ‘restituir a importância que ela tinha no projecto inicialmente gizado pelo arquitecto Barry Parker’. Para tal, propunha
dar ‘uma nova centralidade à estátua’ fazendo-a ‘deslocar uns metros para o lado do Passeio das Cardosas’ (in jornal ‘Público’ de 11.10. 2000).
Ora, não vemos como colocando a estátua de D. Pedro IV no extremo da placa central ela irá ganhar a ‘nova centralidade’. A não ser que se pense em demolir o Palácio das Cardosas aumentando para sul a projectada avenida!
Por outro lado, Barry Parker, nunca se referiu a qualquer perda de centralidade da estátua ao procurar, no seu plano, respeitar a ‘ vista que vai da estátua no centro da Praça da Liberdade até à torre da Igreja da Trindade’. Ao mesmo tempo considerava a Praça da Liberdade ‘já fechada pelas edificações da parte sul’.

Na sua posição actual, a estátua ganha monumentalidade ao ficar na intersecção de dois eixos visuais partindo dos torreões da ‘Nacional’ e do edificio onde esteve o Banco Inglês. Ao ser rodada de 180º a sua leitura frontal fica prejudicada pelo fundo uniforme do Palácio das Cardosas com cuja massa arquitectónica se confundirá.
Por outro lado, desaparece o efeito de surpresa que se colhe hoje a quem descendo a rua dos Clérigos e entra na Praça da Liberdade surgindo-lhe então a estátua. Se o monumento for deslocado mais para sul ficando no enfiamento com a Igreja dos Congregados ele começa a ser visto na posição invertida desde o início da Rua dos Clérigos.

III
Camels, o autor da estátua de D. Pedro IV, ao descrever o seu projecto afirmava: "... procurei sair da rotina ordinária sem todavia me afastar das regras que os artistas da antiguidade nos legaram". O Duque de Saldanha vendo a figura régia esculpida em bronze teria dito: "É o mais perfeito retrato do Imperador que tenho visto" (in jornal "O Nacional" de 22 de Agosto de 1865). Sant'Anna Dionísio, no "Guia de Portugal":
"Depois do monumento a D. José I, no Terreiro do Paço, é estátua-equestre mais valiosa que o país possui, superando como obra de arte a estátua de D. João IV (de Francisco Franco), de Vila Viçosa".
Foi certamente atendendo ao seu valor histórico-artístico que, em 1982, o Decreto n.º 28/82 de 26-2 a classificou como Imóvel de Interesse Público.

IV
No discurso da inauguração da estátua de D. Pedro IV, o rei D. Fernando afirmou:
"O monumento que ali está erigido acabará um dia, como se finou o cidadão ilustre a quem é consagrado. O tempo tudo destrói, gastará aquele bronze, e fará desmoronar os mármores sobre que assentam os seus fundamentos. O esforço e a energia do homem não pode chegar a eternizar senão a fama.
Mas a recordação do Rei, do Legislador e do Soldado perpetuar-se-á com a memória da Liberdade, que deu à sua Pátria, e com o testemunho das grandes virtudes cívicas que lhe ornaram o espírito".
’(in ‘Comércio do Porto’ de 20.Outubro.1866).

A estátua de D. Pedro IV, apesar dos seus quase 140 anos parece ostentar um relativo bom estado de conservação. A predição de D. Fernando ainda está longe de se concretizar. O seu bronze não está gasto e os mármores em que assentam os seus fundamentos ainda não se desmoronaram.
Contudo, o afastamento do local onde foi erigido não provocará danos no monumento?
E ficando em posição invertida com leitura mais difícil e sem a monumentalidade que tinha, isso não representará um menosprezo pela memória do Rei Libertador por parte da ‘Invicta Cidade’ em cujo escudo municipal D. Pedro IV, em 8 de Abril de 1833, mandou apor a condecoração da Torre e Espada ‘em honrosa comemoração dos sacrifícios por que se achava passando’ durante o Cerco do Porto ?
Que ‘gratidão’ é esta a de hoje para com os ‘Soldados e Generais todos descuidados da vida nessas linhas e nesses redutos apresentávamos nossos peitos ao ferro e fogo inimigos’? »
Porto, 16 de Março de 2005
A.C.E.R.-ASSOCIAÇÃO CULTURAL E DE ESTUDOS REGIONAIS

(texto recebido hoje e hoje publicado com autorização da A.C.E.R)